quinta-feira, 4 de outubro de 2007

UMA IMIGRANTE NÃO EMIGRADA

A ausência por aqui não foi falta de inspiração nem de amor à literatura ou mesmo de fidelidade aos leitores do meu blog. Foi somente um espaço de tempo onde fui à China e voltei a São Paulo.

Dedicarei uma crônica inteira à China, mas não hoje. Calma. Hoje minha inspiração me leva a falar de um tema surgido durante um jantar com um amigo brasileiro na semana passada, que emigrou para o leste europeu há 10 anos, mais especificamente para a Hungria. Aliás, muita gente não sabe que a origem do nome Hungria é fome ! Isso mesmo: fome. Hungary significa fome em inglês.

Ainda não conheço Budapeste, adoraria sentar num restaurante da Paris do Leste e ouvir um grupo de ciganos tocar seus violinos tomando uma taça de ‘Tokay’ ou do tal do ‘Gere’. Este último é o vinho produzido pelo pai daquele famoso ator, Richard Gere, que é húngaro. De todas as formas, dizem que o vinho é excelente.

Eu e meu amigo Gábor conversávamos sobre economia e política brasileiras, ambos contávamos sobre como foram os dois últimos anos de nossas vidas, os dele em Budapeste e os meus aqui em São Paulo.

Acho que acabei fazendo-o de psicólogo. Como bom ouvinte que ele sempre foi, ouviu atentamente aos meus lamentos tupiniquins a despeito da carga tributária, da corrupção brasileira e de minhas próprias mazelas econômicas.

Enquanto conversávamos, ele me contava sobre a vinda de seu pai imigrante ao Brasil por volta de 1950. Anos em que o Brasil ainda era inóspito aos olhos europeus, mas o governo brasileiro nem tanto. O país precisava do conhecimento e da determinação de imigrantes que traziam consigo a dor da fome, da guerra e do frio.

Cheguei à conclusão e disse a meu amigo que tenho me sentido como uma imigrante que nunca emigrou. Tive todos os sintomas do imigrante recém-chegado em minha própria terra nos últimos três anos.

Guardadas as proporções lingüístico-metafóricas, sentir-se num país onde não se consegue entender a política, não se consegue entender os noticiários sobre economia por quê eles parecem tão surreais, não entender por quê as empresas pequenas pagam tantos impostos e as grandes ganham perdões tributários, não entender por quê tentativa de assalto dá cadeia e de suborno dá mídia...

Como imigrante não-emigrada desisti de tentar compreender. Hoje falo mais inglês que português no país de onde não emigrei e onde me condicionei propositalmente a me sentir como uma imigrante: é mais suave a música que se sente que a música que se verbaliza em vocábulos.

É certo que uma vez por ano meu amigo vem matar as saudades do arroz-com-feijão e bife, do Sonho de Valsa (que não é mais o mesmo depois que a Lacta vendeu sua fábrica para a americana Kraft Foods) e da pizza paulistana. Goulash toda semana ninguém merece !

Fiquei com o arroz-com-feijão, fritas e bife acebolado, deixa o goulash para os gringos.

Klaudynha