domingo, 1 de julho de 2007

AULA VAGA

Esta é uma pequena homenagem aos professores de Matemática que odeiam corrigir erros de Português. Também uma homenagem ao Professor Fernando, bom de papo, de copo, de taça, de caneca, de tacinha... :-D

...

A aula de Contabilidade Geral para o segundo Processamento ‘A’ tinha sido uma tormenta sobre o Mar Morto. Aquela classe não tinha mais jeito mesmo ou eu é que não tinha mais jeito para a coisa. O pior é que eu estava abandonando o leme de um navio cuja bandeira precisava ser trocada: de preta com caveira para branca com cachimbo da paz!

Fazer o quê? Ganhar uma miséria fazendo a relação Custo & Benefício? Nem com a ajuda da mão invisível de Adam Smith!

Elaborar considerações sobre as regalias que o colégio dava – dentro ‘daquele’ esquema, claro – e sobre o fato de que minha presença ali só se fazia necessária duas vezes por semana, desconsiderando as reuniões pedagógicas, cursos sugestivos de neurolinguística, elaboração de provas oficiais, extra-oficiais, trabalhos escolares, correção de todos estes... Ah ! Os tripulantes tinham que aprender a nadar. Já era tempo. Que viesse uma broaca velha àqueles piratas órfãos da Dona Boa Educação do Senhor Bom Senso ensinar que débito era (era não, é!) a aplicação dos recursos e que crédito a origem dos mesmos. Sinal mais para débito e sinal menos para crédito. Sinal verde para a broaca velha vir e sinal amarelo para eu cair fora.

Lembrar daquela vírgula no final da resposta sobre uma pergunta referente ao conceito de Despesa foi o ponto final. Corrigir erros de Português é uma coisa de estupidez é outra. Não que eu me exaltasse com facilidade, mas cá entre nós, ex ou não-professores: joguinho eletrônico, heavy metal, giz branco e contabilidade decididamente resultam numa salada russa em Paris... Pior que sair da aula para ‘posso comer um cheese-salada na cantina, Professora’ só mesmo ‘posso ir NO banheiro, professora’...

Era um tal de ‘Professora, posso ir NO banheiro’ que numa bela manhã de terça-feira a minha bexiga quase estourou de cistite e perguntei à classe:

- Escuta aqui, pessoal, o que é que vocês tomam no café da manhã, cerveja ?

A classe caiu na risada. Santo remédio para o excesso de vontade de ir AO banheiro essa cerveja que eu usei. Sabe que o congestionamento nos banheiros diminuiu? Estranha essa juventude de uns dez anos para cá depois da minha... Há poucos anos tudo era tão diferente. Há dez então nem se fala ! Ouvir no segundo dia de aula um ‘A Sra. Fala muito difícil, professora’ já começou a me preocupar.

Eu dizia a eles para animá-los e em partes também para esconder meu lado adolescente que não existem pessoas burras, mas pessoas que têm preguiça de pensar.

Bem, a primeira vez que ouvi essa frase não foi exatamente com esse samba-enredo. Foi um pouquinho diferente, de um palhaço que sentava ao meu lado, na faculdade, o Reginaldo. Que figura!

Certo dia, ou melhor, certa noite, depois de uma carregada aula de Matemática Financeira, depois de ele ter resolvido um problema sobre montante com juros compostos e verificado a minha dificuldade em chegar ao resultado rapidamente, virou-se para mim e disse que eu não era burra, mas que tinha preguiça de pensar. Ele estava tão certo que eu levei uns cinco anos para concordar com ele. Coisas da vida...

Deixem-me ver onde parei... Ah ! Na vírgula no final da resposta,

Foi naquele dia de um final de outubro, que cheguei no diretor e falei categoricamente que meus demais compromissos profissionais estavam subestimando as potencialidades das duas classes e que eu não poderia prejudicar nem o colégio, nem os alunos, nem os bolsos de seus pais e, portanto, que seria melhor dar a vez para um outro professor que tivesse maior disponibilidade de de horários que eu. Ótima saída. Não é que deu certo ? Consegui que o colégio me dispensasse, ou seja, garanti meu Natal e meu Ano Novo. Bem, o dinheiro seria para garantir a ceia de Natal e o FGTS que sairia dali a um mês garantiria uma garrafa de champagne rose à beira da praia. Praia Grande, lógico, que ninguém é perfeito né?

De vez em quando sinto saudades, mas acho que foi melhor assim. De qualquer maneira, a minha alegria em me ver livre daquele povo de falsa esquerda, diga-se absolutamente pós-modernistas em termos de filosofia capitalista, me deixou com um pé atrás. Hoje sou mais calma, claro, o que prova que tudo tem seu preço.

Tem sido bom para as três partes, tive dito e pedi deferimento.

Atenciosamente, sempre, é claro. Justíssimo.

Claudinha

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